domingo, 17 de agosto de 2008

E finalmente...


... o tão sonhado ouro olímpico. Agora sim, o tão esperado momento: você, brasileiro, unfanista, já pode colocar na vitrola o hino nacional - Ouviram do Ipiranga às margens plácidas... - aliás, jogo rápido: o que quer dizer "plácidas"? Eu confesso minha ignorância, tive que ir ao dicionário para ver que quer dizer "tranquilas". E "fulguras"? E um "lábaro"? E uma "clava"? E "garrida"? Pode ser útil saber o que se propaga cantando. Ou então, atenha-se à mão no peito e siga com o "lá, lá, lá...", ora, ora, convenhamos não é tão grave assim. Para te confortar, informo que você não ficará menos (ou mais) brasileiro cantando (ou não) o hino. Há coisas que não é preciso dizer: elas simplesmente exalam e enchem todo o espaço ao redor. Mas alguns ainda insistem em usar a camisa da seleção, "só pra lembrar".

Mas como eu ia dizendo - já me perdi - você já pode se trancar no banheiro, hino nacional na vitrola, uma discreta toalha com a bandeira do Brasil enrolada no corpo, e sim, masturbar-se chorando: "somos bons! Vamos dominar o mundo! Somos fodas."

Pois bem, é preciso reconhecer o mérito pessoal do garoto: mais da metade dessa medalha é fruto do seu próprio esforço. Mas essa medalha também é a coroação do trabalho do Comitê Olímpico Brasileiro e de todas as políticas públicas para o esporte no Brasil. Sim! A eles lhes cabe a parte menor da medalha. Graças à (inexistente) política estratégica esportiva no Brasil, o garoto foi treinar nos Estados Unidos, onde encontrou pessoas que souberam moldar a argila, desviar corretamente o leito do rio. E o único ouro do Brasil na competição vem de um garoto que treina nos Estados Unidos...

Mas ainda tem o futebol. Ah, esse sim, ainda promete uma medalha, nem que seja de bronze. Mas isso nem é muito segredo: o Brasil deve ser o país com maior número de times de futebol do mundo, e bem ou mal, a seleção natural faz seu papel. Viva Darwin! Mas a China é muito maior que o Brasil. Se eles pegam o gosto pela coisa... em 10 anos, terá uma seleção imbatível e aí vamos ter que abaixar a bola, e assombrados, bater palmas para os dribles de Xung Li.

Caro leitor. A essa altura você já deve ter gozado. Está bem: gozar, no Brasil, é vulgar. Em Portugal, não. Então considere utilizar o termo técnico: ejacular. Limpe direitinho, uma urinadinha depois para limpar o canal. Enxugue as lágrimas (se você ejaculou chorando, é porque foi bom mesmo, não é?). É preciso que a gente não se esqueça que esse ouro é fruto das políticas públicas brasileiras, porque elas têm um custo para a sociedade. Um custo em vidas: muitas pesssoas morreram nas favelas do Rio nas semanas que antecederam ao evento graças à temporária política de 'pacificação' das forças de segurança. Já dizia Sun Tzu: "o objetivo da guerra é a paz".

Mas já que a vida no Brasil não vale nada, lembremos ao menos que essas políticas também têm um custo financeiro, e em um país com tantas outras prioridades, não cai bem que o investimento já feito em áreas não prioritárias seja destruído. Isso me faz lembrar as palavras do prefeito do Rio de Janeiro: os jogos Pan-Americanos não haviam nem bem terminado e ele já falava em "transformar" os complexos esportivos, velódromo, que custaram uma boa grana, em "casas de espetáculo". E aquela idéia de trazer os Jogos Olímpicos para o Brasil? Não tem problema: depois a gente gasta tudo de novo.

É nessas horas que me vem um pensamento: o Brasil é míope. É refém de eleições em um ciclo de 4 anos. Plano de longo prazo não existe e é preciso proteger a Amazônia em quatro anos, erradicar a pobreza e a miséria em 4 anos, educar um povo analfabeto em 4 anos. Ainda está melhor do que as empresas de capital aberto: estas são reféns de resultados trimestrais na nova ordem das bolsas de valores online.

E o que? Não, eu não tenho a solução pra coisa alguma. Nem para o Brasil nem para as empresas. O meu prazer é o pus que jorra de sua unha inflamada. Monarquia no Brasil? Estou fora. E nem vem com esse papo: sou ex-sheik, exilado político. O que eu quero agora é aprender a tocar pandeiro e violão e curtir minha tristeza no desterro e, quem sabe, ganhar dinheiro com isso (no futuro, escrevo um livro sobre meu penar, lasco um processo sobre o governo e vou viver de aposentadoria nas costas de seus filhos e netos, lá em Porto Seguro. Com sorte, esses otários ainda me glorificam). Governar um país como o Brasil? Dá um tempo, eu quero sombra e água fresca.

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